domingo, 7 de setembro de 2014

The New Era writer 7

Com um Primeiro Capítulo prometedor, este blog contém
uma estória  e temas que vamos querer seguir.
Passem por lá, comentem, investiguem,
pois de certeza que ficarão curiosos!

sábado, 23 de agosto de 2014

PASSATEMPO "Destino Celestial" & "Os Filhos de Lúcifer"

Não percam esta grande oportunidade de poderem obter dois livros da Chiado Editora, incluindo o nosso azulinho Destino Celestial. Passem pelo blog Bloco de Devaneios e tentem a vossa sorte! =D


segunda-feira, 11 de agosto de 2014

DESTINO CELESTIAL - 1º Capítulo



1º Capítulo



Virei-me na cama, com os olhos fortemente cerrados.
 – NÃO! NÃO! – Vociferei, agitada.
Acordei ofegante, lavada em suores. Limpei a testa às costas da mão, tentando controlar melhor a minha própria respiração. Virei-me para a mesinha de cabeceira e ao fitar o relógio a descansar em cima dela, arregalei os olhos.
 – Oh, meu Deus! Já é tarde!
Levantei-me da cama, deixando para trás os tentadores lençóis brancos de algodão que me acolhiam e aqueciam tão bem. Corri para a casa de banho a fim de tomar banho.
Minutos depois, saí da banheira, enrolada na minha toalha e dirigi-me novamente ao quarto.
Penteei os meus cabelos curtos e negros como breu. Prestei mais atenção (com fé de esquecer o facto dos meus pesadelos se tornarem cada vez piores) às variadas opções que tinha no guarda-roupa para a minha missão: o que vestir no primeiro dia de aulas do 10º ano?
Escolhi (muito na defensiva) uns jeans escuros, uma camisola de manga comprida de um verde musgo com o decote em V, bastante apropriada para um dia do começo do Outono. Calcei as minhas All Stars pretas e coloquei um brinco de penas em tons de um azul-esverdeado na orelha direita. Mirei-me ao espelho; estava pronta. Peguei na mochila já preparada desde a véspera e desci as escadas. Não ouvi barulho nenhum, o que era estranho, visto que eram 7h30, estávamos a uma Segunda-feira e naquela casa existia um pestinha de oito anos. Fui à cozinha e ao abrir o frigorífico, vi um bilhetinho amarelo lá fixo. E dizia assim:

 “ Bom dia, Brenda. Já saí para o hospital e levei o teu irmão à escola. Não te esqueças que quando saíres da aula de Tai Chi, tens de ir busca-lo à escola. Preparei-te um lanchinho, está no frigorífico.
 Boa sorte para o primeiro dia. Beijos “.

O bilhete tinha sido escrito pela minha mãe, Catrina.
Assim sendo, tirei o lanche do frigorífico e coloquei-o na mochila já pesada. Traguei uma caneca de leite com café e depois de terminar, lavei-a. Vesti o casaco de cabedal castanho claro e sai de casa. Comecei a mordiscar uma maçã, enquanto esperava por uma colega minha.
Passados alguns minutos avistei Natalie que tentava correr, mal se empinando nos seus sapatos de salto alto. Ela pensava que necessitava deles, mesmo ao achá-los desconfortáveis.
Não sou nem muito baixa nem muito alta e a altura é a coisa que menos me preocupa na minha bizarra pessoa. Já para Natalie, a altura era importantíssima. E a muito se deve ao sonho de se querer tornar modelo. O que para ela era facílimo, visto que tem uma cara muito fofa, olhos esverdeados amendoados, cabelos lisos e sedosos caídos pelas costas em tons de trigo e uma silhueta invejável.
Natalie levou a sua mão ao peito que se enchia e esvaziava com grande rapidez.
- Bom dia, Brenda. Desculpa lá o atraso.
- Não te preocupes. Bom dia. – Disse ao depositar-lhe dois beijinhos na face coberta de base. – Vamos andando?
- Sim, sim. – Apressou-se a acompanhar o meu passo. – Então? Pronta para o secundário?
Suspirei.
- Temos de estar, não é verdade?
- Pois. – Encolhendo os ombros. – Não temos outro remédio. Já viste como estamos crescidas, Brenda? Desde pequeninas que nos conhecemos e andamos na escola juntas. Parece que foi há um ano atrás que meti conversa contigo no recreio. – Troçou ela, envolvendo um braço à volta do meu pescoço, aproximando-me mais dela.
Ri-me ao recordar essas memórias que partilhávamos.
- É verdade, mas ainda bem que esse tempo já passou.
- Sim, mas não tens saudades da ignorância e inocência da infância? De só pensares no próximo brinquedo que vais pedir amanhã aos teus pais?
- Mãe. – Relembrei-a, baixando o olhar.
- Ah, pois. Desculpa. – Murmurou Natalie com pitadas de culpa na sua voz.
- Não faz mal. E, honestamente, não. Não tenho saudades de nada disso. Natalie, estou a ver que hoje acordaste com uma forte onda de nostalgia, porém é para o nosso futuro que temos de olhar.
- Tens razão, Brenda. E é por isso mesmo que este ano vai ser diferente.
- Hum, sim será diferente, bastante diferente, aposto. Mas… ao que te referes especificamente?
- Refiro-me a rapazes, fofa. – Disse, enquanto mimou bem a palavra “rapazes”.
- Oh, isso. – Suspirei e olhei-a de esguelha.
- Não digas “isso” dessa forma. É muito importante, sim?
- Hum, para ti pode ser, já para mim…
- Estás a ver? Isso é o teu espírito pessimista a falar, certo? Mas digo-te, é este ano que nós as duas vamos arranjar uns giraços.
Esbocei um sorriso de soslaio e revirei os olhos.
- Não estou minimamente interessada. Já tenho o que é preciso. E para além do mais, não estou para andar “viciada” – e mimoseei a última palavra com umas pronunciadas aspas – num rapaz que ao fim ao cabo, só me irá trazer problemas.
- Pessimista, como já tinha dito.
- Realista. – Retorqui.
Foi a vez de Natalie revirar os olhos já sem força para continuar a insistir comigo.
Após tamanhas tagarelices, mal nos apercebemos que já tínhamos chegado à escola.
Avistei o novo carro da Volkswagen - que o meu melhor amigo tinha comprado, há cerca de dois meses - no pequeno parque de estacionamento da escola. Eu e Natalie aproximámo-nos.
Quando os seus olhos grandes e muito cinzentos avistaram os meus, ele correu para mim e pegou-me ao colo, como se fosse uma pequena bebé. Os seus braços à volta do meu corpo sabiam-me sempre bem, protegiam-me. Erik deu-me um beijo na face rosada.
- Bom dia, Bree. Como estás? – Quis ele saber no som natural da sua voz que aliava curiosidade a alegria e agitação.
- Hum, bem, apesar de estar um pouco nervosa. – Confessei ao mesmo tempo que os meus pés aterravam no chão, novamente.
- Oh, não estejas. – Colocou as mãos nos bolsos das jeans negras e encolheu os ombros. - O 10º ano não é muito difícil. Aposto que o meu ano – 11º - é muito mais. Mas tu és boa aluna, vais safar-te.
- Claro que sim. – Corroborou Natalie. - Ela é que acordou com o seu pessimismo nato.
Revirei os olhos.
- Oh, bom dia, Natalie. – Disse Erik, parecendo só agora ter reparado nela.
- Bom dia, Erik. Bom, vamos andando? Já deve estar quase a tocar… - comentou Natalie ao ser interrompida, precisamente, pelo toque. Rimo-nos e entrámos no recinto escolar.
Dirigi-me ao meu novo cacifo para depositar os livros que ainda não eram necessários para o primeiro tempo. Natalie não conseguiu ficar com o cacifo ao lado do meu, por isso dirigiu-se até ao fundo do corredor, onde era o seu. Erik despenteou-me os caracóis antes de se esgueirar para a sua aula; já estava atrasado… assim como eu. Agarrei no livro e caderno de Astrologia, tal como no meu estojo. Fechei o cacifo e virei-me, repentinamente, para o lado de onde ficava a sala onde iria ter a primeira aula. Choquei com uma pessoa, o que fez com que a minha respiração fosse cortada. Desequilibrei-me, caí e o mesmo aconteceu aos livros que tinha na mão. O manual caiu em cima do meu joelho, magoando-o ligeiramente. Deixei escapar uns “ui’s” pelos meus lábios entreabertos.
- Devias olhar para onde andas. – Resmungou uma voz funda, sensual e masculina. Comecei a ouvir Wicked Game de Chris Isaak e não sabia bem de onde provinha. Olhei para cima e deparei-me com um rapaz alto, loiro e com olhos azuis muito escuros que me fulminavam.
- Desculpa, não te vi. – Disse-lhe ao franzir o sobrolho.
- Isso sei eu. – Continuou ele. Percebi que a música vinha dos fones que ele trazia nos ouvidos.
- Já pedi desculpa, está bem? – Insisti também. Levantei-me sozinha e apanhei os livros. Bolas, como é que um rapaz tão bonito como ele, podia ser tão antipático, casmurro e nada cavalheiro?...
- Como queiras… - sussurrou ele, virando-me as costas e entrando na sala onde também eu tinha de entrar. Uau! Fiquei com um ótima impressão do meu novo colega. Entrei, por fim na sala.
Fiz má cara, quando o meu suposto lugar (ou seja, ao lado de Natalie) estava ocupado. Imaginem por quem?! Pelo rapaz mal-humorado!
- Menina…? – Questionou a professora. Olhei para a sua secretária; chamava-se Giselle.
- Anderson.
A professora pestanejou e empurrou os óculos pela cana do nariz.
- Menina Anderson, sabe que está atrasada? Cerca de dez minutos?!
- Pois… peço desculpa. – E comecei a ruborizar.
- Não acha que foi uma má impressão chegar atrasada, logo no primeiro dia de aulas?
Acho, mas a culpa não foi minha! Fui contra um rapaz estúpido que me atrasou ainda mais, pensei eu, furiosa.
Porém, tudo o que disse foi:
- Desculpe. – Num tom baixo.
- Pronto, está desculpada. Sente-se, por favor.
- Hum… - Murmurei, pensativamente. Dei trabalho às pestanas, quando os meus olhos foram obrigados a procurar lugares vazios por entre as fileiras de carteiras. Mordi o lábio, ao ver que só tinha mesmo uma hipótese: sentar-me ao lado de uma rapariga… linda. Nunca me tinha deparado com tamanha beleza. Sentei-me, assim, ao seu lado e permiti-me a observá-la melhor. O seu cabelo dava-lhe até ao fundo das costas, era completamente liso e apresentava tons de trigo; os seus olhos eram grandes e azuis-claros; era pálida, o que fazia com que os seus lábios parecessem mais rosados. Deveria ser nomeado crime punível… ser-se assim tão bela.
A rapariga virou os seus olhos para os meus. E durante uma fracção de segundos, rezei para que não tivesse reparado na bisbilhotice.
- Olá, estás bem? – Inquiriu a rapariga ao meu lado. Denotei uns laivos de preocupação na sua voz tão cristalina e límpida.
- Hum… - Pigarreei. – Sim, sim. Estou bem.
- Mentes mal. – Riu-se baixinho. O seu riso era muito amoroso. – Chamo-me Helen e sou uma recém chegada a São Francisco.
- Eu sou a Brenda. – Foi-me impossível não lhe sorrir. Ela parecia ser mesmo simpática e o seu sorriso e olhos pareciam, sem dúvida, hipnotizar. Perguntei-me se ela não teria já chumbado de ano, pois parecia ser mais velha do que eu, apesar do seu semblante jovem.
– Eu nasci aqui nesta cidade e é a primeira vez que frequento o 10ºano e tu?
Helen desviou o olhar para os seus cadernos. Parecia estar a matutar.
- Eu e os meus irmãos chegámos há pouquíssimo tempo aqui. Decidimos passar uma temporada com os nossos tios e tivemos de nos inscrever nesta escola, visto que é a mais perto da mansão.
- Desculpa... – Clareei a garganta, chegando-me mais para ela. Apurei melhor os ouvidos, pois pensei ter ouvido mal. – Disseste… mansão?
Helen sorriu, mais uma vez.
- Sim, mas… não é nada de especial. – Confessou, humildemente.
Não estava habituada a lidar com colegas humildes, tirando os meus dois melhores amigos: Erik e Natalie. Desde os primeiros anos escolares que frequentei, sempre tive de me deparar com colegas que mal tinham algo novo e caro, faziam graças da sua sorte e dinheiro; coisa que nunca me agradou muito. E, agora, acabo de conhecer a minha colega de carteira que vive numa mansão e não acha isso o máximo.
- Então, os teus irmãos também estão nesta escola?
- Sim. O Peter está no 11ºano e o Hayden está neste ano.
- Ah, não escolheu esta disciplina. – Disse eu, como uma certeza.
- Escolheu, escolheu. – Riu-se. – Está ali, do outro lado da sala, sentado ao lado de uma rapariga loira.
O meu coração sofreu um aperto, quando segui a direção dos olhos de Helen.
A rapariga loira a que ela se referiu era precisamente a Natalie. E o estúpido mal-humorado era o Hayden, o irmão de Helen. Incrível...
- Hum… aquela rapariga é a minha melhor amiga e o teu querido irmão roubou-me o lugar! – Exclamei com salpicos de ferocidade na voz.
- Oh, a sério? Queres que lhe peça para trocar de lugar contigo?
- Não, não! – Que rapariga tão prestável. - Não te incomodes. Eu gosto da minha nova colega de carteira. – Sorri-lhe.
Os seus olhos brilharam com mais fulgor.
- Obrigada, mas tens a certeza? Ele não se importaria nada…
- A sério que tenho a certeza. Não quero arranjar mais chatices.
- Mais chatices? O que queres dizer com isso?
- Oh, nada. – Desviando o olhar do dela.
- Diz lá, Brenda. – Teimou ela.
Virou o meu corpo na sua direção para lhe conferir um murmúrio apenas destinado a ela.
- Digamos que o teu irmão, não é nada parecido contigo.
- Porque dizes isso? – Rindo-se baixinho para não incomodar a aula.
- Tivemos um desentendimento no corredor, por isso cheguei atrasada.
- O que é que ele fez desta vez?
Hum... O rapaz já tinha antecedentes problemáticos. Este facto não me surpreendeu de todo. Pareceu-me o tipo de pessoa que fervia em pouca água, coisa que constituía o fio condutor para o aparecimento de sarilhos, obviamente.
- Fomos um contra o outro e ele barafustou como se eu tivesse a culpa total, mas não aconteceu nada de mal.
- Mesmo assim, mereces um pedido de desculpa. Eu trato disso. – E piscou-me o olho.
- O que vais fazer? – Interroguei, quando uma pitada de nervos se apoderou do meu estômago.
- Não te preocupes. – Tentou acalmar-me, no entanto sem efeito.
Passados poucos minutos, a Professora Giselle deixou-nos sair mais cedo, pois decidiu que nesta primeira aula ainda não daria matéria. Marcou um teste diagnóstico para amanhã, com o objetivo de avaliar os nossos conhecimentos gerais. Helen acompanhou-me até ao cacifo.
Perdi Natalie de vista, pois sai da sala depois dela.
Estava a falar com a minha colega de carteira, quando os vi juntos. Arqueei a sobrancelha esquerda. Natalie esboçava um sorriso de orelha a orelha e tinha o braço dado a Hayden que espalhava o seu charme e estilo pelo corredor a fora.
- Hayden? Ainda bem que te vejo, querido maninho. – Falou Helen, num tom confiante. Cheirou-me a puro sarcasmo. - O que é que a mãe e o pai nos ensinaram? Nunca fiquem a dever nada a ninguém. Pois eu acho que ficaste a dever um pedido de desculpas aqui à minha amiga Brenda.
Hayden enrugou a testa, pensando algo do género: é que nem em sonhos faço isso.
- Importas-te? – Insistiu a sua irmã. Eu corava cada vez mais. Os olhos azuis-escuros de Hayden eram intimidantes… intimidantes de mais até. Parece que quando ele me olhava, conseguia chegar ao estado mais profundo da minha alma, fazendo-a despir, nua e crua. Isso fazia-me sentir tão pequena naquele mar turbulento representado no fundo do seu olhar.
- Estou à espera, fofinho. – Pestanejou angelicamente, Helen.
Queria pedir a Helen que parasse com tudo aquilo. Estava tão estupefacta com a situação embaraçosa e bizarra que até fiquei sem reação. A culpa era minha, fui eu quem contou a Helen o insignificante acontecimento no corredor há minutos atrás. Realmente, não fazia ideia do que me tinha passado pela cabeça ao contar-lhe. Foi quase como… como… se ela tivesse arrancado essas informações da minha boca. Para além disso, não sabia a razão que me levou a entregar grande confiança da minha parte aquela figura tão escultural.
Eu não costumava ser assim, meter de imediato conversa com uma pessoa desconhecida. Um mero “olá” era o usual da minha parte.
Desta vez, tal não aconteceu. Isso era um facto. Agora explicar o porquê desse facto, era outra história. Naquele momento, em que me consciencializei de tudo o que se tinha passado em tão reduzido tempo, a minha intuição falou para mim. Senti que havia ali algo de estranho… algo de estranho com estas pessoas tão bonitas.
- Tu vais pagar-me por esta, Helen. – Fazendo um sorriso malicioso à irmã. – Desculpa. – Murmurou sem olhar para mim.
- Ouviste alguma coisa, Brenda? – Questionou Helen, gracejando.
Os dedos da minha mão fecharam-se à volta do seu antebraço.
- Já chega, Helen. – Agora, num tom mais sério.
Os olhos de Helen desviaram-se dos meus para se fixarem na mão que prendia o seu antebraço. Levantou as sobrancelhas finas.
- Tiveste sorte, maninho. Para a próxima não te escapas com tamanha facilidade.
Os dois irmãos desafiavam-se pelo olhar. Até pareciam comunicar pelo pensamento, devido à cumplicidade que sentiam um pelo outro. Eu e Natalie fitámo-nos, igualmente, porém com uma expressão inquisidora.
- Hum, Brenda. – A minha amiga chamou a minha atenção e quebrou o gelo que faiscava entre os dois irmãos. - Eu prometi ao Hayden levá-lo a conhecer a escola, visto que é novo por aqui.
- Se bem que tu também não a conheces assim tão bem. – Comentei.
- Sim, mas… conheço mais do que ele, não é verdade?
- Pois… deve ser…
- Não vais fazer uma visita guiada à Helen?
- Não é necessário, eu aprendo depressa. Além do mais, deve estar quase a soar o segundo toque. – Afirmou Helen. – Não estás a pensar em faltar à aula, pois não Hayden?
- Mais ou menos. – Fazendo uma careta como se fosse uma criança marota.
- Sabes que tens de cumprir as tuas obrigações, não sabes?!
- Sim, sim, Helen. Não te preocupes. – Deu meia-volta com Natalie a seu lado e confidenciou-lhe: - Diz adeus às velhotas responsáveis! – Natalie deu uma forte gargalhada. E por entre as dezenas de alunos, desapareceram do nosso campo de visão.
- Ai, aquele Hayden! – Helen levou a mão à testa.
- Ele é sempre assim?
Helen suspirou.
- Não sabes, nem por isso… ele é bom rapaz. Suspeito que já tens uma má impressão dele, mas ele é muito boa… pessoa. Ele comporta-se assim, porque, para ele, é melhor aproveitar o tempo e fugir um pouco às suas responsabilidades.
Revirei os olhos mentalmente à última palavra que pronunciou.
- Um adolescente pode ter assim tantas responsabilidades?
- Os nossos pais sempre nos disseram que parecíamos muito pouco adolescentes. Por isso, tomam-nos por adultos e sim, há responsabilidades.
- Pois… vocês os dois não parecem nada ter dessásseis, dezassete ou até dezoito anos. – Comentei ao rir-me.
- Estás a ver?! – Rindo-se ela também.
Ouvimos o toque de entrada.
- Bom, vamos?
- Sim, claro. – Disse eu, ao começar a caminhar até à próxima aula.
Mais tarde, Helen e eu dirigimo-nos ao refeitório, escolhendo a nossa mesa. Depressa, a nós se juntaram Natalie e Hayden, muito sorridentes. Eu estava sentada de frente para Helen e ao lado de Natalie, que por sua vez estava em fronte de Hayden. Avistei um rapaz muito alto, de largos ombros e excessivos músculos no peito e braços. Vendou os olhos de Helen com as mãos, deu-lhe um beijinho na face e antes de se sentar entre mim e ela, deu um murro ao de leve no ombro de Hayden.
- Oh, Peter! Quero apresentar-te a Natalie Lewis e a Brenda Anderson. – Declarou Helen com um sorriso resplandescente.
O irmão dela, Peter, beijou a minha mão e a de Natalie. Corámos as duas. Notei, pelo canto do olho, que a gargalhada funda que ouvi, provinha de Hayden.
Depois, os três irmãos levantaram-se e foram-se servir; eu e Natalie fizemos o mesmo.
Escolhemos o mesmo prato: esparguete à bolonhesa. Fomo-nos sentar e lá já se encontravam os irmãos. Esbugalhei os olhos ao ver que os seus pratos continham imensa salada de tomate e alface e ainda três peças de fruta.
- Isso é alguma espécie de dieta ou assim? – Perguntou Natalie a Hayden. Este abriu a boca para responder, mas Helen foi mais rápida.
- Somos vegetarianos.
- A sério? – Interroguei. Peter e Helen acenaram com a cabeça.
Os três irmãos… vegetarianos…? Seria a beleza partilhada pelos três o resultado de uma vida de refeições com legumes e fruta? Não sei ao certo porquê, mas a minha perspicácia afirmou de imediato que não se devia a isso.
Virei a minha atenção para o prato que tinha à minha frente. Passados alguns minutos, ouvi uns passos fortes de umas botas familiares. Olhei para cima. Deparei-me com Erik; estava confuso, desorientado. Olhava fixamente para os nossos novos colegas, os quais não conhecia. Levantei-me, pondo-me ao seu lado com a mão nas suas costas.
- Erik estes são a Helen, o Peter e o Hayden. São irmãos. Helen e Hayden são nossos colegas de turma e o Peter está no 11º ano como tu. – Apresentei-os.
- Sim, nós já nos vimos na sala. – Comentou Peter, esboçando um leve sorriso.
- O Erik é o… - comecei.
- Teu namorado? – Perguntou Hayden, olhando-me com cumplicidade.
- O meu melhor amigo. – Terminei, fulminando-o com o meu olhar. Ele sorriu, mostrando uma covinha de cada lado do seu rosto.
- Muito prazer, Erik. – Disse Helen, estendo-lhe a mão, amavelmente.
Erik contemplou estranhamente a mão pálida de Helen. Sussurrei o seu nome, tentando de alguma forma, trazê-lo da Lua, pois parecia estar lá agarrado como uma lapa.
Ele tossiu e afastou a gola da sua camisola, distanciando-a do pescoço fino.
- Eu… preciso de apanhar ar fresco. Estou cheio de calor. Tu não estás, Bree?
- Eu? Calor? Hum, não, Erik. – A temperatura do refeitório apresentava-se amena. Não entendi aquela sua reação.
- Bom, então vou eu lá para fora. – Falou por entre dentes, dando largos passos até à porta que dava lugar ao belo jardim com banquinhos de madeira.
Fiquei a vê-lo sair do refeitório.
- Hum, desculpem isto… eu… eu vou ver o que é que se passa com ele.
- Mas Brenda, mal tocaste no almoço. – Comentou Natalie.
- Deixa estar, também não tenho muita fome.
Corri até ao jardim e procurei Erik. Estava sentado em cima do encosto do banco e os seus pés em cima do assento. A minha presença assustou-o; não estava à espera. Depressa escondeu um colar que tinha ao pescoço. Pus-me a seu lado. O vento atirava-me os caracóis curtos para o rosto, fustigando-o.
- O que é isso?
- Isso o quê?
- O que acabaste de esconder por debaixo da camisola.
Erik sorriu para mim, o típico sorriso de uma criança apanhada com a comer demasiados doces, coisa que não devia.
- Mostra-me. – Pedi e pousei o queixo no seu ombro direito.
Erik revirou os olhos e tirou o colar para fora.
O seu fio de prata tinha um medalhão oval. Agarrei nele, analisando-o.
- És membro dos Illuminati e não me contaste? – Rindo-me.
No medalhão estava cravado um olho egípcio e ao seu lado (envolvendo uma parte do olho) estava desenhada uma asa branca de um anjo, supus.
- Nada disso, Brenda.
- É giro e… arrepiante ao mesmo tempo. Onde o compraste?
- Não o comprei, deram-mo.
- A sério? Quem?
- O meu tio, aquele velho maluco, sabes?
Sim, como podia esquecer o Tio Thomas? Um velho careca de barbas grandes e grisalhas que nunca saia de casa. Ele morava perto de Erik, mas não se dava com ninguém, nem mesmo com a sua família.
- O Tio Thomas deu-te esse colar… - disse realmente desconfiada e intrigada.
- Sim! – Exasperou. - No Sábado apareceu lá em casa a dizer que eu precisava de abrir os olhos, porque eles tinham chegado.
- O quê? – Enruguei a pele da testa. - Eles quem?
- Não faço ideia! Ele é maluco. O meu pai queria levá-lo para o hospital, mas ele recusou, claro. E só se foi embora, quando me viu pôr o colar ao pescoço e disse que nunca o deveria tirar. E também, me alertou para os meus sonhos.
Esqueci-me de que como respirar, quando o meu estômago se contorceu. Sonhos…?
- Que sonhos?
- São mais pesadelos. Estranhos. Parecem vindos de um filme.
- E… o que vês nesses sonhos? – Interroguei baixinho.
- É difícil de explicar. São imagens pouco distintas e passam muito depressa, como um filme acelerado. Nalguns sonhos, vejo um grande Palácio, noutros, uma gruta escura. Vejo guerreiros, sangue, uma certa penugem branca e preta.
Tentei não fazer uma cara horrorizada. Nem acreditava no que me tinha sido relatado. Era exatamente o que eu sonhava: um Palácio altíssimo de um estilo gótico; uma gruta criada de um nada; num campo seco, havia guerreiros a lutar, bastante sangue era derramado. Só que… nos meus sonhos, os guerreiros eram anjos. Havia duas espécies de anjos: uns tinham assas brancas outros, asas pretas e os dois grupos lutavam um contra o outro.
Pensei que era melhor não dizer nada a Erik. Não o queria preocupar, embora eu estivesse.
- Hum, isso deve ser a tua imaginação nata a trabalhar arduamente. – Ri-me, tentando que ele acreditasse em mim; depois lembrei-me do que Helen disse: mentes mal.
- Pois, se calhar deves ter razão. Ando a ver filmes a mais. – Erik fez-me uma festinha nas costas.
- Porque é que fizeste aquilo lá dentro há bocadinho?
- Nem eu sei ao certo. Tive um pressentimento. Eu sei que vou fazer figura de idiota ao dizer-te isto e ao acreditar no Tio Thomas, só que… não pude deixar de associar a chegada destes… novos colegas com o que o velho maluco disse.
Nisto, as palavras citadas por Erik ecoaram na minha mente.
E tal como ele, caí em mim e fui incapaz de desassociar estes dois fatos.
- Estou a ver que andas mais espiritual do que eu. – Dei uma gargalhada, abafando o jogo mental de intuição que pairava na minha cabeça.
- Pois é, Miss Tai Chi.
- Tiveste um pressentimento do quê?
- Acho que me devo distanciar Deles.
Quis revirar os olhos.
- Porquê? Fizeram-te algum mal?
- Não… até agora.
Senti os pelos do braço erguerem-se.
- Estás mesmo a ver filmes a mais, Erik. Esquece isso e anda lá para dentro.
- Vai tu. Eu fico aqui. – Olhando para um horizonte que eu não conseguia avistar.
- És mesmo teimoso. – Disse-lhe em tom de censura. Esperei que ele desse o braço a torcer, mas não o fez, como se fosse uma grande surpresa para mim. Levantei-me e bati com o pé no chão antes de caminhar de volta ao refeitório. Entrei e comecei a arranjar melhor o meu cabelo. Sentei-me no meu lugar sem dizer uma única palavra.
Acabámos de almoçar e fomos para a última aula do dia. Prestei muito pouca atenção.
Helen permanecia ao meu lado em silêncio, tirando as devidas notas no seu caderno de Literatura Inglesa. Eu tinha a cabeça cheia de mais para, como ela, tirar apontamentos.
Não conseguia parar de pensar no facto de Erik e eu termos mais ou menos os mesmos sonhos. Não era normal. Eu já tinha aquela espécie de sonhos/pesadelos desde, sensivelmente, os meus onze anos. A minha mãe pensava que era algo causado pelo início da minha menstruação, pelo que esta veio um pouco mais tarde do que os sonhos.
A minha mãe, excelente médica, insistiu que eu fizesse alguns exames, nervosa por talvez existirem alguns paradigmas desiguais aos das outras adolescentes. Eu fi-los, mas nada iniciava qualquer anomalia. Por isso, a minha mãe inscreveu-me em aulas de Tai Chi, onde aprendi a fazer meditação e a acalmar o meu subconsciente. Tinha resultado muito bem, até há duas semanas atrás. Os sonhos começaram de novo a atormentar-me, tirando-me o sono. E com isto, as minhas olheiras ficavam mais e mais evidenciadas a cada dia que passava. O toque soou. Salvador!
Enquanto eu arrumei os meus pertences, Helen mirou-me com minucia.
- O que foi?
- O que foi pergunto eu, Brenda. Estás bem? Estás muito pálida.
- Estou ótima, Helen. Estava só a pensar.
- A aula toda?
Acenei com a cabeça.
- E em quê? Na matéria não foi, seguramente.
Encolhi os ombros, evitei o seu olhar, meti a mala às costas e fui ao meu cacifo.
Retirei o pequeno espelho que tinha lá escondido e observei a minha pele e olheiras. Meu Deus! Estava com um aspeto deplorável. Hoje tinha de fazer meditação, sem falta.
- Mas que look! Gosto disso. Assim uma espécie de princesa gótica. – Falou Hayden atrás de mim, segurando a mão de Natalie.
Virei-me repentinamente, com um grave acesso de fúria.
- Tu não fales do que não sabes nem entendes! – Berrei-lhe.
Os olhos de Hayden ficaram deveras, surpreendidos pelo meu tom de voz. Nada mais disse.
Vi Helen pelo canto do olho. O seu encanto fazia toda a multidão de estudantes desviar-se do seu caminho com o propósito de a contemplarem fixamente. Ela movia-se com grande graciosidade e o seu cabelo cor de trigo esvoaçava-lhe pelas costas.
- Acho que precisas de te acalmar, Brenda, querida. – Murmurou, baixinho.
Agarrou na minha mão esquerda, levantou e começou a massajar a palma. Fechei os olhos e não pensei em mais nada. Foi como se em dois minutos fizesse meditação em pé e não na posição lótus.
Que calma e tranquilidade…
- Melhor?
- Hum-hum. – Afirmei ainda de olhos fechados.
Helen parou de me massajar a mão e a minha mão foi para baixo como se fosse muito pesada. Finalmente, abri os olhos.
Não avistei Hayden nem Natalie, só Helen que sorria, mostrando uma fileira de dentes branquíssimos e todos muito bem alinhados.
- Obrigada. Acho que todo o meu stress desapareceu.
- Não tens de quê. Ainda bem que agora sim, está tudo bem.
Dirigimo-nos ao parque de estacionamento. Helen aproximou-se de um Mercedes cinzento, onde já estavam Peter (no lugar do condutor) e Hayden (ao lado do lugar do condutor). Helen abraçou-me e disse que foi um enorme prazer conhecer-me e eu retribuí o elogio. O carro deles arrancou e eu acompanhei Natalie até à sua casa.
- Tu e o Hayden têm… um caso ou assim? - Interroguei a Natalie. Esta olhou para mim ao semicerrar os olhos, enquanto eu continuei a olhar para o chão.
- Dificilmente...
- Estou a ver... – Tentando acompanhar o seu raciocínio.
Os seus olhos encontraram-se com os meus.
- Já reparaste na maneira como ele te olha? – Fez-se Natalie notar.
- Hum… o que queres dizer com isso?
Ela sorriu. O seu braço rodeou-me os ombros e deu-me um beijinho na bochecha.
- Brenda, Brenda. Ainda és tão inocente.